Será o fim da isenção de impostos para pequenas compras da shein, shopee e todo comércio exterior?

Por Felipe Athayde

O hábito brasileiro em comprar na internet – e do exterior, sobretudo da China – só aumenta. Dados apontam [1] que em 2022 a Shein, por exemplo, faturou 8 bilhões de reais com uma base sólida de consumidores brasileiros.

O livre comércio está para as importações, assim como para os fabricantes e comerciantes nacionais. Em paralelo a isso, cabe à nossa Administração Pública (governantes) a difícil tarefa de: permitir a liberdade mercantil e incentivar uma ou outra prática (comércio local ou importação) a título de regulação.

Regulação não somente em índices econômicos, mas inclusive de legalidade em atos como o combate à sonegação fiscal.

Importações realizadas hoje em um limite da valor que se entenda pequeno pelo governo, hoje de 50 dólares, entram em um conceito de “minimis”, uma prática comum ao redor do mundo definida pela Câmara de Comércio Internacional como “um limite de valor (teto) de importação de mercadorias até o qual poder-se-á conceder isenção de taxas e impostos e redução dos procedimentos aduaneiros”. [2]

Desde 1999 as encomendas enviadas de uma pessoa física para outra neste valor são livres do imposto de importação. De lá para cá, a Receita Federal do Brasil identificou práticas criminosas de empresas que se passam por pessoas físicas para enviar encomendas aos clientes no Brasil, para assim não serem tributadas.

Em outra estratégia para burlar o Fisco, empresas realizaram declarações de conteúdos de produtos como inferiores a 50 dólares, quando na verdade não o eram. Ou, o dividiram em vários pacotes, para que todos ficassem abaixo do valor que seria tributado.

Na presente semana, a Receita Federal anunciou o fim da isenção nas transações entre pessoas físicas. Logo em seguida, a primeira-dama anunciou em suas redes que a tributação será cobrada das empresas, e não dos compradores, o que causou grande movimentação e comentários.

Passo então a analisar a pretensão estatal e seus possíveis impactos

Imagine um produto que você compre de uma destas lojas por 100 reais. Na composição deste preço, temos: mão de obra, matéria prima, custos do fabricante, frete, custos do fornecedor, impostos, lucro e outros componentes de preço. Atente agora aos últimos dois itens mencionados: impostos e lucro.

O imposto sobre a importação que não era aplicado a pequenas compras passaram a ser, e no percentual de 60%. O fornecedor passa a ter, matematicamente, três opções: 1) reduzir sua margem de lucro, 2) aumentar o preço da venda, o que podemos interpretar como um repasse do valor do novo encargo ao destinatário final – consumidor, ou 3) ratear com o consumidor o novo encargo. Em era capitalista, ouso retirar de cogitação a primeira alternativa. Poderíamos concluir que o consumidor final vai pagar esta conta?

Importante saber que, se você achou alto o percentual de 60% sobre a importação, devo lhe lembrar que o mercado nacional já sofre tributação de até 80% sobre o valor – e muitas vezes você paga sem saber.

Estrategicamente, neste quesito de regulação de mercado, o governo teria duas alternativas para tornar mais competitiva a disputa entre os mercados internos ou externo: diminuir a carga tributária interna ou aumentar a tributação sobre a importação para justificar a “proteção ao mercado interno”.

Em melhores palavras, a Professora Tatiana Lacerda Prazeres ensina que por protecionismo “entende-se medida governamental tomada com vistas a assegurar mercado interno a produtores nacionais, afastando a concorrência externa”. E continua, sobre o neoprotecionismo, lhe definindo caracterizando por “utilizar formas mais sofisticadas de proteção não-tarifária, ainda que sejam empregadas com o mesmo fim das medidas protecionistas tradicionais”. [3]

Isto é, foi uma medida protecionista e convencional aumentar a tributação aqui discutida. Seria uma medida neoprotecionista regular o mercado sem intervir diretamente nos impostos, como por exemplo, criar regras e normas técnicas de qualidade para produtos importados, o que não foi a opção do governo.

Após esclarecer o contexto em que surge a tributação na importação de pequeno valor e abordar um conceito econômico, encaminho para conclusão trazendo uma última temática, a Extrafiscalidade.

Perceba que a razão de ser da cobrança de impostos, que tecnicamente chamamos de tributação, existe para garantir recursos para a administração pública, permitindo satisfazer as necessidades básicas da vida em sociedade e a concretização dos seus deveres constitucionais: como saúde, educação, segurança. Podemos chamar esse processo de arrecadação de Fiscalidade.

Por vezes, no entanto, o tributo é utilizado com finalidades que vão além da arrecadação para os objetivos acima ditos, podendo visar a regulação de mercado que já discutimos. Essa intenção é um processo chamado de Extrafiscalidade, o que definitivamente está presente no novo cenário da importação de compras de pequeno valor.

E no final desta equação quatro elementos se acomodam da seguinte forma: o Governo Federal aumenta a sua arrecadação. Os empresários brasileiros ganharão ao ter mais competitividade, pelo aumento do preço do seu concorrente estrangeiro. O mercado exterior perde, pois poderá vender menos. E o consumidor brasileiro… Este, pagará mais impostos.

 [1] Shein fatura R$ 8 bilhões em 2022 e se estabelece no cenário brasileiro. Disponível em < https://www.ecommercebrasil.com.br/noticias/shein-fatura-r-8-bilhoes-em-2022-e-se-estabelece-no-cenario-brasileiro#:~:text=3%20min-,Shein%20fatura%20R%24%208%20bilh%C3%B5es%20em%202022%20e%20se%20estabelece,que%20n%C3%A3o%20veio%20para%20brincar.> . Acesso em 13 de abril de 2023.

[2] CCI. Customs Guidelines. Disponível em <https://iccwbo.org/content/uploads/sites/3/2003/06/ICC-Customs-Guidelines.pdf >. Acesso em 13 de abril de 2023.

[3] PRAZERES, Tatiana Lacerda. Comércio Internacional e Protecionismo: As barreiras técnicas na OMC. Ed. Aduaneiras.

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